quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

Quando muito perto se torna perto demais






Todos nós sabemos que os tempos mudaram. E, como provável consequência, a forma como nos relacionamos também mudou. Existe hoje em dia uma forma de se relacionar que poderíamos chamar de relação próxima. Mas será que este tipo de relação suporta uma intimidade?

Eu sou próximo de fulano, que é próximo de sicrano, que é próximo de beltrano e assim vai tal como a “Quadrilha” de Drummond. E também tal qual a “Quadrilha”, ninguém está junto ao outro de fato, ficam apenas próximos.
O filme “Closer” (EUA, 2004) que foi baseado em uma peça teatral homônima escrita por Patrick Marber (que também assina o roteiro da versão para o cinema) e dirigido por Mike Nichols, nos traz a história de quatro pessoas e as relações que estabelecem entre si, ora como casal, ora como rival. E, tanto em um papel de casal como em um papel de rival, as relações não deixam de ser próximas. Próximas, mas sem intimidade.
Alice conhece Dan que conhece Anna que conhece Larry que conhece Alice. Como a “Quadrilha”, ninguém está com ninguém, o que se tem são situações onde a intimidade é jogada para longe dali.
O título, por exemplo, já nos diz algo: “Closer – Perto Demais”. Closer, em inglês, tem origem no adjetivo close, que, dentre vários significados, encontramos perto, próximo, íntimo. Com o acréscimo da letra “r” cria-se o grau comparativo de adjetivo Closer, significando “Mais Perto” (nome da tradução para a peça de teatro). Contudo, a tradução do título do filme para o português, como de costume, elege uma versão da história que está sendo contada. Sendo assim, temos “Perto Demais”.
Penso que as duas traduções se complementam, pois “Mais Perto” seria a tradução concreta, a tradução mais próxima ao original, que nos traz o sentido de intimidade, ou da busca dela. “Perto Demais”, por outro lado, seria a realidade do filme, aquela que nos mostra o quão difícil é para os personagens estabelecerem relações de intimidade com o outro, pois quando se tenta chegar perto, sempre se chega perto demais e, assim, existe a destruição do encontro, da relação.
         Ao final, o que encontramos? Muitas pessoas que só conseguem entrar na intimidade da relação com o outro no que diz respeito a sua parte boa, prazerosa. O gostar, nestes casos, só está presente enquanto é algo novo e inusitado, enquanto representa algum desafio. A arte da conquista se tornou mais importante do que o objeto conquistado.
Desta forma, torna-se difícil estar com o outro, pois a conseqüência deste estar junto é a inevitável intimidade em relação a si mesmo. Inevitável uma vez que o outro se torna também um espelho, um reflexo, de nossos aspectos ordinários (comuns) e imperfeitos e, no mundo onde a valorização está naquilo que é “o” mais bonito, “o” mais novo, “o” de última geração, estas partes que nos fazem seres-humanos, não têm lugar!